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O surgir das universidades

Você já parou para pensar quando surgiram as primeiras universidades? Além disso, com qual propósito a universidade foi criada? Neste artigo compartilho contigo um pouco de história, algumas curiosidades e, como sempre, algumas reflexões a respeito da educação dos adultos.


Podemos começar explorando o termo 'universidade'. O que ele nos diz? Quando você pensa numa Universidade, o que vem na sua mente? Para compreendermos melhor, temos que resgatar o conceito de 'Universitas', em latim, que significa universalidade, conjunto, comunidade, associação, ou seja, uma Universidade deveria ser mais que uma escola de nível superior voltada para a educação de jovens e adultos. Como afirma o historiador italiano, Giovanni Reale (1990), “o termo universidade, originalmente, não indicava um centro de estudos, mas muito mais uma associação corporativa" (p. 480).


O conceito de universidade surge como um encontro de mestres e aprendizes, para debater e compartilhar saberes, à semelhança do que acontecia na Academia de Platão, no século IV a.C., e nas escolas neoplatônicas, durante vários séculos. Um dos motivos do surgir das instituições universitárias foi o acúmulo e curiosidades do saber humano, e isso não é exclusivo do Ocidente, ou da Europa, como muitos afirmam.


Academia de Platão - Atenas
Academia de Platão

Os frequentadores das universidades medievais, por exemplo, estavam ali porque pretendiam associar suas ideias com as ideias dos outros. Além disso, dialogar, aprender, compartilhar, explorar, testar, validar, essas eram algumas das intenções dos universitários, tanto dos mestres, como dos aprendizes. Tanto que, o conceito de universalidade é muito interessante, pois dá a sensação de que aquele ambiente é para todos (ou pelo menos, deveria ser), tanto para quem ensina, como para quem pretende aprender.


As primeiras universidades


Os centros de aprendizagem para jovens e adultos já existem há muitos séculos. Além da Academia Platônica, que podemos considerar como a primeira universidade 'não formal', temos ainda a Universidade de Nanjing, que adota nomes diferentes em cada dinastia chinesa. Ela é considerada a primeira universidade oriental, fundada em 258. Além dela, destaco a Universidade de Constantinopla, fundada em 425, sob o nome de Pandidakterion (Πανδιδακτήριον), considerada a primeira universidade do continente europeu. Temos, então, a primeira universidade no Oriente (Nanjing - China) e a primeira universidade no Ocidente (Constantinopla - atual Istambul, na Turquia).


Na Índia, há registros de cinco centros de aprendizagem budistas para adultos, que alguns autores consideram como sendo universidades. São eles, o centro de aprendizagem de Nalanda (séc. V), Somapura (séc. VIII), Odantapura (séc. VIII), Vikramashila (séc. VIII) e Jagaddala (séc. XI). As instituições budistas em questão, atraem estudiosos de todo o mundo, sendo a maioria deles adultos.


No passar dos séculos, várias insituições de ensino superior vão sendo criadas. Destaco a Universidade al Quaraouiyine, em Marrocos, fundada em 859, começa como uma escola muçulmana e se torna uma referência nos estudos islâmicos para jovens e adultos. Da mesma forma, a Universidade de Al-Azhar, fundada em 988, junto da Biblioteca do Cairo, faz da cidade do Cairo um grande centro cultural nesta época.


Perceba que as instituições de ensino que estamos destacando foram criadas com um propósito: a partilha de saberes, entre todos aqueles que estavam em busca de novos conhecimentos. Um local de muitas trocas e aprendizagens era a Escola de Medicina Salernitana, com educadores renomados como Garioponto, Alfano I e Trotula de Ruggiero, que ensinavam sobre medicina, filosofia, teologia e direito.


As universidades europeias


Se você abrir o navegador e iniciar uma pesquisa sobre o surgir das universidades, perceberá que já no século XI, surge a Universidade de Bolonha, em 1088. Nesta instituição, mestres universitários de renome estiveram por lá. Irnério, jurista italiano, considerado um dos grandes professores de Direito na Idade Média, 'deu aula' em Bolonha por muitos anos. Inclusive, muitos alunos ilustres passaram por esta instituição. Dentre eles, estão Pepone, Bulgarus, Martinus Gosia e o próprio Papa Alexandre VI.


Universidade de Bolonha - Itália
Universidade de Bolonha

Logo na sequência, menos de uma década depois, surge a Universidade de Oxford, fundada em 1096, no Reino Unido. Até os dias de hoje, Oxford é uma referência no ensino, mas saiba que em seu início, não era tão popular como a instituição de Bolonha. Foi somente a partir de 1167, que ela passa a receber um número significativo de estudantes.


A Universidade de Paris, fundada em 1150, se torna referência pelas escolas de Filosofia e Teologia. Estudantes de vários países da Europa vão até lá, para aprenderem com os mestres universitários. Em Paris, é possível afirmar que se fomenta o debate intelectual e de renovação das ideias, o que chama a atenção de muitos nobres daquela época. Um dos mais renomados educadores da época, Pedro Abelardo, recebia muitos estudantes em suas aulas, inclusive, se criavam longas filas e até disputa para conseguir uma vaga para aprender com ele.


Universidade de Paris - França
Universidade de Paris

Posteriormente a Universidade de Cambridge, fundada em 1209, se torna referência para aqueles que buscam aprender sobre matemática, física e astronomia. Depois disso, entre os anos de 1200 e 1300, surgem diversas universidades na Europa. Destaco as universidades de Salamanca (Espanha – 1218), Pádua (Itália – 1222), Nápoles (Itália – 1224), Toulouse (França - 1229); Siena (Itália - 1240), Valladolid (Espanha – 1241), Sorbonne (França – 1253), Múrcia (Espanha - 1272), Montpellier (França – 1289), Coimbra (Portugal – 1290), Alcalá de Henares (Espanha – 1293) e Lérida (Espanha - 1300).


A partir do século XIV, as universidades iniciam uma expansão pelo território europeu, em especial ao norte do continente. Até o ano de 1500, surgem universidades na Áustria, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Escócia, Hungria, Polônia, Reino Unido, República Tcheca e Suécia, além do aumento de instituições nos países já citados: Espanha, França, Inglaterra, Itália e Portugal.


A estrutura e o propósito das primeiras universidades


Esse é um ponto muito interessante, que vale ser destacado. Segundo diversos pesquisadores e historiadores, algumas universidades não possuíam prédios próprios e as aulas eram ministradas em salas das Abadias, nas casas dos professores e, até mesmo nas ruas. Nem todas possuíam bibliotecas ou laboratórios, pois esse não era o propósito das universidades. Segundo Étienne Pasquier, a universidade medieval é feita de homens, homens em busca de saberes.


A preocupação das universidades medievais é a formação do ser humano, que aprende e ensina, tornando o conhecimento acessível a quem tiver o interesse.

O saber deixa de ser um dom, uma graça divina, como era considerado até então. Torna-se uma atividade humana que qualquer um que possuísse intelecto racional poderia desempenhar, ou seja, qualquer ser humano. O conhecimento, o ensino e o saber adquirem uma dimensão nova e essa é a grande inovação da universidade. (Oliveira, 2007, pp. 124-125).

A memorização e fixação do conteúdo não fazia parte da maioria dos educadores, pelo contrário. No início das universidades, principalmente nas universidades europeias, a influência socrática e platônica era muito visível, principalmente pela constante valorização das experiências dos estudantes e pela utilização de analogias e metáforas durante o ensino. Era um ambiente bem andragógico, que explorava, inclusive, o autoconhecimento por parte dos aprendizes jovens e adultos.


Lembra que há pouco mencionei o educador Pedro Abelardo e a grande procura pelas suas aulas? Nos encontros com ele, assim como nos encontros com vários outros mestres universitários, “a aprendizagem dos conteúdos, contudo, não acontecia pelo puro e simples transmitir de informações do mestre ao aluno; as aulas eram dinâmicas, plenas de discussões, que levavam à reflexão dos assuntos tratados” (Oliveira & Tanaka, 2022, p. 126).


E não foi apenas Aberlardo! Gasparino Barzizza, Vittorino da Feltre, Lorenzo Valla e tantos outros educadores levaram seus aprendizes à reflexão, ao pensamento crítico diante de um novo saber. O ensino não era top-down, pois se fosse, não haveria esse interesse genuíno pelo debate, pela troca de saberes. Ali, na universidade, através do diálogo, os mestres universitários formavam pessoas críticas.


Na verdade, tanto os mestres como os estudantes frequentavam a universidade por este propósito: aprender a pensar com criticidade. Esse pensamento crítico, desenvolvido nas instituições de ensino superior, com o tempo, infelizmente, perderam forças. Atualmente, mesmo com salas de aulas, recursos didáticos, bibliotecas e laboratórios, a ênfase dada não é mais no saber, mas esse é tema para um outro artigo.


Gostou de saber mais sobre a história das universidades? Deixe seu comentário aqui embaixo. Um abraço!

 

Para referenciar o artigo, utilizar:


Beck, C. (2022). O surgir das universidades. Andragogia Brasil. Disponível em: https://andragogiabrasil.com.br/surgir-das-universidades

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